quarta-feira, 10 de agosto de 2011

"TA TUDO ALI ... DENTRO DA CABEÇA!"




Fonte Site - http://www.3zone.com/

Jogo Mental

Em época de decisão olímpica, como a etapa de WCS de Londres neste final de semana, a importância do preparo psicológico na performance do atleta faz a diferença.

por Nicole Tauchmann


A psicologia do esporte nunca foi tão abordada por jornalistas e comentaristas como aconteceu nestes últimos Jogos Olímpicos. O que mais se ouviu falar a respeito daqueles atletas “favoritos”, promessas de medalha, mas que ficaram só na promessa, foi que “sentiram o peso dos Jogos” ou “que faltou cabeça”. Ao mesmo tempo que a importância do preparo psicológico é discutida em rede nacional e vista como fundamental, aspecto raramente abordado e valorizado até então (pelo menos nessa dimensão), a falta dele não pode ser avaliada como responsabilidade única destas promessas não terem subido ao pódio.

O fato é que não existe favoritismo em Jogos Olímpicos. Todos ali desejam ganhar e se prepararam muito para isso. E tão importante quanto aquilo que o atleta pensa, é o que os espectadores pensam sobre ele, o que a população brasileira espera dele.

A preocupação exarcebada com a preparação física, técnica e tática somada a este favoritismo da mídia, faz com que o atleta vá para a competição com a certeza de uma vitória. Mas no esporte não existem certezas. Quando este sentimento existe o desejo de ganhar se ameniza. Como consequência o medo de perder pode se tornar maior do que a vontade de vencer. Percebeu a diferença?

Enquanto inúmeros técnicos brasileiros dizem não precisar de um psicólogo esportivo em suas equipes, Michael Phelps considera indispensável. Lá fora o psicólogo é uma peça tão importante quanto a de um fisioterapeuta, nutricionista ou médico. Ele trabalha junto à comissão técnica. Este trabalho inter-disciplinar não prioriza apenas os atletas profissionais, ele acontece desde os times de base, com os principiantes do esporte. Felizmente esta realidade já acontece em alguns clubes no Brasil. Aguns treinadores bem-sucedidos dão grande importância à preparação psicológica e ao aspecto motivacional da sua equipe. Mas por que a inserção do psicólogo não é tão valorizada quanto a de um fisioterapeuta ou nutricionista?

Um dos motivos que me faz acreditar que isso não acontece se dá ao fato da maioria dos brasileiros associarem a figura de um psicólogo a questões como fraqueza, crise e problema. Mas aí eu pergunto: será que os nossos atletas precisarão chegar ao fundo do poço para perceber que o mental faz parte do funcionamento de um organismo, e como qualquer outro aspecto precisa ser treinado? Afinal é ele quem comanda os movimentos, antecipa saídas para qualquer adversidade, seja ela a perda de um equipamento ou um pneu furado, fazendo com que situações como estas não coloquem em risco toda uma preparação. De que adianta se preparar durante anos e fazer com que a ansiedade interfira no rendimento?

Não é possível que ainda não esteja claro para as pessoas que a ansiedade e o estresse podem interferir no desempenho do atleta. Quando isso acontece os músculos se contraem, a respiração encurta-se e fica bloqueada, limitada aos níveis superiores dos pulmões, sobretudo à parte alta. Respira-se curtinho e, na maioria dos casos, só se faz esta respiração alta. Levando à perda da concentração e da fluidez dos movimentos.

JOGOS PSICOLÓGICOS
Nestas Olimpíadas pudemos observar exemplos claros de que se pode ganhar ou perder uma medalha antes mesmo da competição começar. Na natação isso acontece na sala de espera, um espaço retangular que antecede às piscinas, onde os nadadores passam 30 minutos aguardando serem chamados. A sala foi criada para que os organizadores do evento se assegurassem de que os atletas não se atrasariam para as suas provas.

Muitos descrevem como sendo o momento mais estressante de uma competição. Onde, para fugir de conversas ou olhares que possam distrair sua atenção, MP3 são utilizados. O que dizem é que Michael Phelps ouviu a todo volume Rick Ross e Jay-Z antes de suas provas, desligando-se de tudo que não fosse a batida musical. Para ele deu certo. Já Dara Torres, sua companheira de equipe, costuma conversar com quem estiver por perto para preencher o silêncio.

Diferentemente de Phelps e Torres, esta sala é conhecida pela maioria dos atletas como câmara de tortura psicológica, pois o atleta fica cara a cara com seus adversários, e se não estiver fortalecido mentalmente poderá se abalar com os jogos psicológicos utilizados pelos seus concorrentes. Neste momento expressões ansiosas, pálidas, desligadas, ou vagamente intimidadoras são vistas e, se o atleta não estiver focado e seguro de sua preparação, poderá se intimidar e entrar na competição inseguro de suas capacidades.

Se preparar para lidar com situações decisivas como esta faz parte da preparação global do atleta. São muitos os esportes que reúnem os atletas momentos antes de uma competição. O triathlon é um exemplo. No momento da largada a tensão e o nervosismo dos outros competidores podem ser sentidos e, se um preparo especial para este momento não for realizado, sentimentos negativos de quem estiver por perto pode ser contagioso.

Este é mais um exemplo de que a prova começa muito antes do que muitos imaginam. Se afastar deste “bolo” de atletas e utilizar visualizações positivas de momentos de sucesso, ou colocar os óculos, fechar os olhos e imaginar uma competição onde você foi espetacular, são opções para não se intoxicar com sentimentos dos outros. Mas antes disso, uma dica: quando estiver aquecendo, concentre-se na respiração, perceba que é necessário levar o ar ao seu abdômen e não somente ao peito.

Após terminado o aquecimento respire focando sua atenção apenas no abdômen, ele deve subir quando você inspirar e se contrair quando expirar. Seus batimentos ficarão mais lentos. Respire fundo imaginando estar envolto por uma luz clara (a cor será escolhida por você no momento, isso acontecerá naturalmente). Permita que seu corpo todo respire, como se os poros de sua pele se abrissem e respirassem. Você se sentirá ainda mais energizado. Neste momento lembre-se dos treinos mais difíceis, daqueles que você acordou cedo, enquanto a maioria abortou por causa da baixa temperatura. O objetivo é escolher os que você se superou por algum motivo. Guarde-os na memória desde já e, dias antes da prova, eleja os mais importantes. Assim ficará mais fácil lembrá-los.

A preparação mental está diretamente ligada à obtenção de recordes e superações de limites em todos os campos de nossas vidas. Não permita, portanto, que opiniões alheias interfiram no que você realmente acredita ser importante na sua preparação. Afinal, você não deseja ser apenas mais um entre milhares. Deseja?
TÓRIAS DE JOGOS PSICOLÓGICOS

No passado a sala de espera para as provas de natação não chegava a ser exatamente uma sala, era um corredor com bancos situados a poucos metros do deck da piscina.

Nas Olimpíadas, qualquer contato físico entre os competidores é calculado. Em uma palestra dada por Brian Goodell durante um camping na Universidade de Stanford, ele falou sobre o quão enervante pode ser ficar na sala e explicou o que ele fez nos Jogos de 1976 para ganhar vantagem antes de sua prova, os 1.500m livre.

Desgrudando-se da sua cadeira como se não tivesse preocupação alguma, Goodell, então com 17 anos, nervoso e recém-chegado à cena internacional, andou pela sala e apertou a mão dos competidores, desejando boa sorte a cada um. Depois saiu e ganhou a prova por 1s51, superando o recorde mundial que ele mesmo estabelecera um mês antes.

Antes da final dos 200m borboleta de 1976, os americanos Steve Gregg e Mike Bruner estavam na sala, de frente para Roger Pyttel, da Alemanha, que tinha quebrado o recorde mundial de quatro anos de Mark Spitz na prova.

- Nós nos divertimos muito com Roger - disse Bruner, lembrando da cena que ambos fizeram. – A conversa entre nós ia bem: ’Você acha que ele fala inglês? Bem, talvez não. Eu não vi nenhuma reação no rosto dele. Talvez ele não entenda’. Houve uma pausa, e depois um de nós disse ‘Você sabe, se os americanos dominarem o pódio, ele será enviado de volta para a Sibéria’.

O rosto de Pyttel ficou pálido, disse Bruner. Ele e Gregg se olharam e Bruner lembrou que um dos dois disse: “Eu acho que ele entende inglês”. Enquanto eles foram para os blocos, contou Bruner:

- Ficou claro para nós. Nós tínhamos pego ele.

Bruner ganhou o ouro e quebrou o recorde de Pyttel. Gregg foi prata e outro Americano, Billy Forrester, bronze. Pyttel foi o quarto.

Em Munique-1972, Spitz também teve um parceiro para o jogo psicológico. Ele lembra de ter levado seu técnico, Sherm Chavoor, para a sala.

- Eu ia dizer a Sherm: ’Estou tão agoniado, um lixo’ e ele iria passar a mão em meu ombro enquanto meus adversários nos encarariam com a boca aberta – disse Spitz. – Na verdade, não havia nada errado comigo. Só queria que meus rivais achassem que eu estava arrasado.

Ele ganhou sete medalhas de ouro naqueles Jogos, todas com quebra de recorde mundial.

Medalha de ouro nos 100m livre de Tóquio-1964 graças, possivelmente, a estratégias usadas por ele na sala de espera, Don Schollander escreveu em sua autobiografia “Deep Water” de 1971, que “desestabilizar psicologicamente o adversário faz parte do jogo. Você tem que saber aceitar e também fazer”. E acrescentou: “Em Jogos Olímpicos, a prova é ganha na mente”.

cole Tauchmann
Psicóloga do Esporte
nicole@trisport.org

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